LABORATÓRIO DE HISTÓRIA PÚBLICA

Apresentação
O conhecimento sobre o passado tem interessado grupos cada vez mais abrangentes e não satisfeitos com o ensino escolar de história. Ao mesmo tempo, a precariedade do ensino escolar público brasileiro afeta tanto a qualidade educacional quanto o interesse dos jovens pela atuação em instituições escolares públicas. Por outro lado, os espaços não-escolares de formação histórica têm proliferado em todo o mundo, seguindo mais o ritmo dos interesses de mercado do que uma reflexão qualificada sobre esse campo. Além disso, podemos dizer que a formação institucionalizada para uma “história pública” no Brasil é praticamente inexistente. O curso de História da UNIFAL tem tratado desses problemas, até agora, por meio de projetos de ensino, pesquisa e extensão desarticulados entre si. A nossa proposta almeja fortalecer esses projetos, articulando-os, a fim de criarmos novas oportunidades de ampliação e institucionalização desse novo tipo de formação histórica demandada pela sociedade contemporânea.

Objetivos
Explorar novas mídias para a construção e comunicação do conhecimento histórico. Preparar os(as) graduandos(as) em história para a atuação em espaços não-escolares de formação histórica. Estabelecer parcerias com públicos diversificados a partir da compreensão de suas diferentes demandas por conhecimento histórico. Articular as ações de ensino, pesquisa e extensão de história pública preexistentes na UNIFAL-MG em um programa que nos permita avançar em reflexões teóricas e práticas capazes de aproximar a nossa atuação profissional e formativa das demandas de comunidades extra-acadêmicas. Construir respostas junto com os públicos interessados para as diversas demandas de sentido por eles apresentadas. Promover uma reflexão articulada a respeito das complexidades envolvidas nas formas contemporâneas de experiência do tempo. Levar adiante a institucionalização de um Laboratório de História Pública na UNIFAL-MG, com estrutura, instalações e recursos humanos análogos aos de seus congêneres em outras IFES brasileiras. Incentivar a elaboração de outras ações de extensão, para além daquelas que compõem esta proposta de programa, a serem submetidas como fluxo contínuo ao longo do ano de 2020.

Justificativa
Focaremos aqui apenas em alguns aspectos locais que também demonstram a urgência de tornar a UNIFAL-MG uma referência regional para a reflexão e ação no campo da história pública, uma vez que essa discussão será aprofundada teoricamente adiante. O Sul de Minas contemporâneo conformou-se historicamente pela expansão de atividades agropastoris integradas aos circuitos de abastecimento dos centros urbanos do Sudeste, em especial do Rio de Janeiro, que se desenvolveram a partir de fins do século XVIII (PASCOAL, 2008). Com o processo de expansão industrial e urbana iniciado na virada do século XIX para o XX no Brasil, o projeto ideológico progressista dominante passou a contrapor o “progresso” das regiões litorâneas ao “atraso” dos “sertões” (NEVES, 2013), e o modo de vida “caipira” (CANDIDO, 1975; FRANCO, 1974; OLIVEIRA, 2003) passou a ser cada vez mais desqualificado em face dos novos padrões de consumo importados da Europa como modelo civilizacional. Um dos movimentos de retorno ao passado regional que tem ocupado nossos memorialistas é a demonstração de que cidades como Alfenas também estiveram sincronizadas com o ritmo do progresso universal, ao contrário dos estereotípicos que se consolidaram a respeito das comunidades do interior. Isso pode ser facilmente verificado em livros como Memórias pitorescas de Alfenas, de Sonia Boczar (BOCZAR, 2018) ou mesmo no recente “Projeto Formosa”, idealizado pelo Rotary Club para compor as comemorações dos 150 anos da cidade, em que se pretendem apresentar um rol das personalidades ilustres (em geral associadas às elites econômicas locais) que contribuíram para o progresso da cidade, o que não exclui a própria UNIFAL-MG em suas comemorações pelo seu centenário (CORRÊA e AVELINO, 2014). Todavia, da mesma forma como ocorreu nos grandes centros urbanos, a imposição de um projeto modernizador no interior também provocou conflitos com populações colocadas em posição de subordinação neste projeto. A contribuição econômica do Sul de Minas para o desenvolvimento da colônia se deu por meio da escravização, da mesma forma que a ocupação da terra significou a extirpação de comunidades originárias. O “progresso” nada mais significou que uma imposição acelerada do modo de vida ocidental em detrimento das cosmologias ameríndias e africanas que existiam e continuam existindo na região. A demanda pela preservação e revitalização da memória desses diferentes modos de vida, que têm ganhado força a partir de eventos como o Encontro de Matrizes Culturais Africanas, de festejos como a Folia de Reis, o Congado, o Jongo, o Samba, de retomada de terras e de identidades ameríndias por grupos como os Xukuru Kariri e os Kiriri em Caldas, das lutas pela reforma agrária por militantes campesinos da região, bem como a crescente conscientização da população em geral a respeito do caráter destrutivo do processo de modernização, tudo isso tem cobrado um posicionamento de nós, historiadores(as) profissionais, em eventos, pesquisas e ações formativas que evidenciem a contribuição desses grupos para a constituição e superação da nossa realidade social contemporânea. O Sul de Minas também não está apartado da expansão global das telecomunicações, cujos impactos culturais podem ser sentidos nas novas formas hegemônicas de aprendizado e comunicação que impactam, diretamente, a atuação de professores(as) de história na região (LOWANDE, FONSECA e FERNANDES, 2019). A difusão das redes sociais virtuais pelo interior também tem provocado, por aqui, polarizações políticas e uma guerra de memórias em que as “fake news” têm ocupado um papel destacado. Esses desafios também demandam uma atuação urgente no âmbito da formação de professores(as). Outro aspecto que precisa ser mencionado é o fato de que a já aludida expansão do interesse pelo passado também tem resultado na proliferação de dispositivos de memória no Sul de Minas. Tanto polos regionais quanto pequenas cidades da região têm assistido à proliferação de museus, arquivos, monumentos e eventos voltados para o passado que demandam, cada vez mais, a atuação de profissionais qualificados. O Laboratório de História Pública poderia suprir esse tipo de demanda formativa regional, sanando uma lacuna dos nossos currículos universitários, ao mesmo tempo em que ofereceria aos nossos(as) graduandos(as) outras expectativas de atuação no mercado de trabalho, tendo em vista que, infelizmente, a atuação na educação pública tem se tornado cada vez menos atrativa. Isso não significa, no entanto, um abandono do compromisso do curso de história para com o fortalecimento da educação pública, gratuita e de qualidade. A capacitação de nossos(as) graduandos(as) e a formação continuada para professores(as) de história da região para a utilização qualificada e responsável dos novos meios de produção e comunicação do conhecimento histórico também é uma forma de aprimorar e valorizar a história e as humanidades em geral no ensino básico.

Beneficiário
Estudantes e professores(as) da rede básica pública municipal, graduandos(as) do curso de História, profissionais de instituições de memória e comunidade em geral.