PROJETO RESPIRA: UNIVERSIDADE E ESCOLA JUNTAS CONTRA O RACISMO

Apresentação
Respira: Universidade e Escola juntas contra o racismo tem como objetivo ensejar um conjunto de ações junto à comunidade da Escola Estadual Deputado Domingos de Figueiredo, do município de Varginha, com vistas ao estimular o debate sobre racismo estrutural e luta antirracista. Para tanto, as ações terão, por um lado, caráter informativo, na medida em que levarão ao conhecimento da comunidade o tema das relações étnico-raciais; por outro lado, comtemplarão a participação do público-alvo em debates, criações artísticas, pesquisas, entre outras atividades, com objetivo de mobilizar a agência dos próprios sujeitos num processo que leve à “desnaturalização” do mundo social e racialmente estratificado, livrando as consciências dos arquétipos elaborados pela lógica colonial-capitalista.

Objetivos
1. Apresentar o tema do racismo estrutural e da luta antirracista aos estudantes do segundo e do terceiro ano do Ensino Médio. Realizar atividades de forma transversal, de acordo com o calendário acadêmico da escola, e em comum acordo com os(as) professores(as) de determinadas disciplinas, tais como Sociologia, Filosofia e Projeto de Vida. Os conteúdos serão combinados com os professores e professoras, levando em consideração o conteúdo prévio das disciplinas e a experiência de ensino de cada um(a). 2. Realizar ações que atraiam os estudantes para a produção de algum conteúdo sobre o tema do racismo e da luta antirracista; 3. Realizar atividades no chão da escola, que tenham participação da comunidade escolar; 4. Construir com a comunidade acadêmica uma nova compreensão do mundo, de forma a desconstruir a naturalização do racismo, presente nas subjetividades e nas mentalidades dos sujeitos; 5. Abrir algumas trilhas para projetos de pesquisa futuros.

Justificativa
O racismo estrutural tem sido extremamente útil para a consolidação de uma nova era do capital sob o neoliberalismo. A inflexão racial tem auxiliado o processo de divisão internacional do trabalho, empurrando ainda mais o sujeito negro para o trabalho precário, além de segregá-lo nas periferias territoriais, do conhecimento, da cultura e do lazer. Outro aspecto importante, segundo Oliveira (2021), tem sido a captura das pautas raciais e das identidades legítimas dos sujeitos negros pela fração dominante, reduzindo-as a uma dimensão individual e competitiva. Ou seja, o protagonismo dos negros tem sido refreado por ideias como “empoderamento” individual e meritocracia liberal, num processo que visa a impedir transformações estruturais da sociedade. O mesmo problema, segundo o autor (OLIVEIRA, 2021), pode ser observado no interior do próprio movimento negro, quando algumas de suas correntes pautam discussões sobre quem é negro e quem não é [o tema do “colorismo” é o mais evidente], fragmentando o coletivo e enfraquecendo as suas lutas. Esses aspectos exigem um movimento contracorrente, que esclareça as estruturas socioeconômicas e políticas que fundamentam as desigualdades raciais. Segundo Soares e Krenzinger (2017), a educação tem um papel fundamental para mitigar a reprodução das desigualdades. No entanto, a Escola continua sofrendo forte influência das tragédias sociais que estão em seu entorno, como violência, ausência de políticas inclusivas eficientes, escassez material das famílias e evasão escolar. Segundo os autores (SOARES; KRENZINGER, 2017), a PNAD de 2015 revelou que o Brasil possuía, à época, 2.486.245 crianças e adolescentes entre 4 e 17 anos fora da escola. “Desse conjunto, 1.543.713 eram adolescentes de 15 a 17 anos, que deveriam estar matriculados no ensino médio. Esta foi a modalidade que apresentou o crescimento mais tímido de inclusão na última década: de 78,8% para apenas 82,6%, entre 2005 e 2015” (SOARES; KRENZINGER, 2017, p. 23). Ao mesmo tempo, conforme os mesmos autores, dados do IBGE/PNAD Contínuo/201 indicam que, embora haja evasão no ensino fundamental, os índices disparam quando se observa o fenômeno no Ensino Médio, quando os estudantes têm, em princípio, idades entre 15 e 17 anos. Entre eles, há uma maioria de estudantes negros, do sexo masculino, que vive em famílias com baixa escolaridade e com baixa renda. Outros dois aspectos que valem a pena serem ressaltados são a Reforma do Ensino Médio e o Movimento Escola Sem Partido. Como tivemos a oportunidade de tratar em outro texto (DIAS, 2018), no Brasil, agências nacionais e internacionais têm se engajado, ao longo da história, para inscrever interesses particulares nos conteúdos escolares. Nos tempos neoliberais, esse fenômeno parece ganhar novos enredamentos. Desde o início dos anos 2000, vem se acentuando o interesse de grandes corporações pela gestão, currículo e conteúdos escolares. Fundações ligadas ao grande capital têm sido exitosas ao imprimir às políticas educacionais uma agenda “de mercado” (SAVIANI, 2007), fato que parece culminar, em 2017, com a aprovação da Reforma do Ensino Médio (Lei 13415/2017) que, entre outras medidas, torna opcional o ensino de ciências humanas em determinada etapa da formação dos jovens. Em meados da década de 2010, o projeto de lei 7180/2014, chamado “Escola sem Partido”, ensejado por setores com viés de extrema-direita do país, ganha relevância no debate público. Os seus defensores, inicialmente, condenavam o que consideravam “doutrinação ideológica marxista” e “abuso de liberdade de ensinar” do professor. A apropriação por outros setores da sociedade, especialmente grupos religiosos, acabou por converter o projeto num movimento contra o que classificam “ideologia de gênero”, que, na prática, significa censura a todo e qualquer debate e acolhimento da diversidade no interior da escola, seja diversidade de gênero, sexual ou religiosa (MIGUEL, 2016). Ambos os projetos são parte da tentativa da fração hegemônica do capital de neutralizar qualquer tipo de construção de pensamento crítico na escola, com objetivo de consolidar projetos de formação de trabalhadores adaptados à ordem social excludente. Não obstante a escola ser alvo das políticas regressivas e do racismo estrutural, ela continua se mantendo como uma das dimensões da sociedade onde é possível estabelecer a crítica às pautas neoliberais. Ou seja, se a ideologia neoliberal está cada vez mais presente na escola - estabelecendo projetos para formar sujeitos concorrenciais, trabalhadores precários “empreendedores” e “flexíveis” – a educação formal, paradoxalmente, constitui-se como terreno onde o elemento popular entra em contato com códigos de argumentação lógica, capazes de instrumentalizá-lo para duvidar de argumentos positivistas (SCHLESENER 2016). É também a escola o lugar onde os indivíduos vivenciam experiências coletivas e onde conseguem alcançar uma individualidade crítica. Os aspectos elencados acima justificam esse projeto.

Beneficiário
Comunidade escolar da Escola Industrial. 700 estudantes e 65 professores e funcionários.